O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atendeu a pedido do Estado de Santa Catarina e suspendeu determinação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) para que o Estado pague penalidades adicionais de R$ 3,2 bilhões referentes à dívida com a União. A decisão foi proferida nesta terça (23), no âmbito da Ação Cível Originária 3485, ajuizada pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) no mês de março, e vale até o julgamento definitivo do mérito.
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No caso, a PGE/SC, embasada em subsídios fornecidos pela Secretaria de Estado da Fazenda, questiona judicialmente ato administrativo da STN, que classificou o Estado como “descumpridor do teto de gastos” no exercício financeiro de 2018; o órgão federal considerou que o Estado, na ocasião, não teria cumprido a obrigação de limitar o crescimento das despesas ao percentual de 3,75% em comparação com o exercício financeiro de 2017, o que correspondia à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Em razão disso, o órgão impôs penalidades que revogavam o prazo adicional de 240 meses para o pagamento da dívida pública, e determinavam o pagamento imediato de reduções extraordinárias previstas na Lei Complementar Federal nº 156, de 2016. Se mantido, o ato administrativo implicaria a necessidade de pagamento a maior no valor de R$ 3,2 bilhões, referente à dívida do Estado com a União, ou obrigaria o Estado de Santa Catarina a firmar neste ano de 2021 aditivo da dívida pública com a União, com base na recente Lei Complementar Federal nº 178, de 2021, em condições bem mais onerosas que as atuais.
Para o relator da ACO, “não é possível concluir que o cumprimento dos limites mínimos previstos na Constituição possa ocasionar o descumprimento de uma norma que repercute sobre o contrato em curso”, pois isso criaria “a esdrúxula situação de o Estado ser obrigado a descumprir a Constituição para poder cumprir os termos do acordo”. Segundo o ministro, a Lei Complementar 178/2021 aboliu a aplicação de sanção para os Estados que, em observância aos limites mínimos constitucionais, ampliarem seus gastos em saúde e educação em proporção maior que a variação do IPCA no mesmo período.
“Diante desse cenário, tem-se que a retroatividade da norma administrativo-sancionatória mais benéfica (LC 178/2021) incidirá sobre fatos jurígenos ocorridos em período anterior à sua vigência, alcançando os atos ocorridos em 2018/2019, circunstância hábil a atrair a impossibilidade de se aplicarem as sanções previstas nos parágrafos 1º e 2º do artigo 4º da LC 156/2016”, afirmou o relator do processo.
Estados não têm controle/discricionariedade para conter crescimento de despesas de saúde e educação”, afirma Procuradoria
Em recurso administrativo, a PGE/SC e a SEF já haviam sustentado que o aumento da despesa primária decorreu do crescimento acima da inflação da receita estadual, o que levou à ampliação do valor necessário às despesas constitucionais obrigatórias para as áreas de saúde, educação e débitos de precatórios – fixadas sobre percentuais da receita tributária.
Para os procuradores que atuam no caso, o crescimento das despesas constitucionais obrigatórias, no que exceder a variação do IPCA, não devem ser consideradas para efeito do disposto no artigo 4º da Lei Complementar Federal nº 156/2016, merecendo, portanto, ser excluídas do cálculo. “Há inegável postura contraditória em, de um lado, se exigir que os Estados apliquem determinado percentual nas áreas de educação e saúde e, de outro, inviabilizar a fruição de um benefício em razão de a STN considerar o cálculo do teto de gastos do Estado nos moldes previstos nos arts. 198, § 2º, 212, caput, e 101, caput, da Constituição Federal”.
No entendimento da Procuradoria, ao editar a Lei Complementar nº 178, de 2021, o legislador federal atentou para a circunstância de que não está no âmbito de controle/discricionariedade dos Estados conter o crescimento de despesas de saúde e educação, quando houver diferença positiva entre a variação anual das bases de cálculo dos mínimos constitucionais e a variação do IPCA. Daí porque defende que o mesmo entendimento deve ser aplicado também à análise do cumprimento da LC 156/2016.
O procurador-geral do Estado, Alisson de Bom de Souza, afirma que a decisão é uma vitória significativa para Santa Catarina, que “não pode ser penalizada pelo êxito da atividade econômica e da competência da atuação fazendária que implicou crescimento de arrecadação acima da inflação”.
“A elevação do gasto foi justificada, pois se deu em áreas de necessária e impositiva aplicação constitucional de recursos, quais sejam, saúde, educação e pagamento de débitos de precatórios. O mínimo a ser aplicado nessas áreas tem relação direta com percentual das receitas obtidas, por determinação da Constituição. Então, esse crescimento resultou de uma atuação eficiente dos órgãos fazendários do Estado de Santa Catarina, associada ao crescimento econômico estadual. E não é justificável, sob qualquer perspectiva, a penalização de Santa Catarina em razão disso”, assegurou.
Atuam na defesa do Estado, além do procurador-geral, o procurador-geral adjunto para Assuntos Jurídicos, Sérgio Laguna Pereira, e os procuradores do Estado com atuação na Procuradoria Especial em Brasília, Fernando Filgueiras e Weber Luiz de Oliveira.